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quarta-feira, 26 de junho de 2013






"Comigo, ninguém tem paciência!”.


Escrevo mais como passatempo do que para ser lido pelo mundo brasileiro afora. Quem ainda lê hoje em dia? Alem das citações, das reclamações, das bobeiras postadas no facebook, ninguém lê coisa alguma nestes dias de revoluções e apostasias. Imagino que alguns cristãos leem a Bíblia, ainda, antes da oração matinal, antes do começo do dia, antes do trem, do metrô, da caminhada, da bicicleta...antes que a vida comece. Todavia certas tradições são importantes, por isso esta cronica se fez necessária, para os amigos, pelo menos.

Ano pobre em cronica, porem rico em águas. Muitas águas rolaram na vida aqui na região basca francesa, literalmente. A primavera chegou e se foi e a cronica não veio. Faltou criatividade durante os longos meses de dilúvios e enxurradas sem fim. Nos altos Pirineus, casas foram arrastadas para dentro dos rios, o santuário de Lurdes ficou de baixo d'água e os turistas voltaram para onde vieram, pois o astro rei nos abandonou este ano e a praia ficou da cor de rio sujo e foi interditada. A primavera foi invernal e o verão está mais com cara de outono do que de estação propicia à praia. Nas montanhas, a neve continua cobrindo os altos picos, mesmo em pleno verão. Coisa rara em final de mês de junho, nestas latitudes franco-espanholas. São os finais dos tempos!

Depois do inverno, uma viagem ao Brasil, marcou uma parte importante da vida. Pude compartilhar, fazer e dirigir teatro, comer churrasco e tomar chimarrão, rir, chorar... Rever a família depois da perda de minha querida mãe, foi muito importante, mas o silencio ao entrar na casa onde ela morou e eu cresci, foi horrível e indescritível. Mesmo em cronicas a gente não consegue escrever a dor do vazio, da falta que uma pessoa tão querida como uma mãe faz em nossa vida.

A viagem foi: seis aviões, as igrejas, as palestras; o corre-corre no sul, em Brasília, Goiânia, as pamonhas, BH, os restaurantes mineiros, Juiz de Fora com amigos que conheci em Bethune, Cabo Frio e a festa para comemorar os 50 anos. O bolo foi feito no Rio e tinha a cara do Chaves, literalmente. Não podia ser outro bolo e tinha que ter sido feito no Rio. Isso, isso, isso, pois para um pastor que canta musica barroca (com voz de castrado), faz teatro e mora no sul da França, somente um bolo com a cara do Chaves poderia servir para uma comemoração tão importante. 'Comigo, ninguém tem paciência!'

Antes do aeroporto, uma parada no aniversario da Volantes em Serô onde estudei na década de 80. Isso somente entenderá quem foi volantes, os outros vão passar para o próximo paragrafo, ou parar por aqui. Cronica chata!

Assim que voltei para a França, fiz um batismo numa praia em Biarritz, me mudei para outro bairro de Bayonne, participei de conferencias pastorais regional e nacional, fiz um enterro de uma senhora de 100 anos e falei num encontro da ABU sudoeste. Neste encontro da Aliança bíblica universitária, nas minhas palestras, tive tradutora. Não porque tenha falado em português. Nada disso, falei em francês mesmo, todavia tudo foi traduzido para o chines. Que outra língua esperavam que fosse? Mesmo nos confins do sudoeste da França, grande parte dos participantes nos congressos para estudantes cristãos, é composta de jovens do gigante asiático. A igreja chinesa está enviando missionários para evangelizar estudantes chineses nas universidades do Hexágono. Interessante!

Voltando do Brasil pensei na realidade dos anos que passam, pois como todo mundo, estou ficando mais maduro, com mais cabelos brancos. Tudo isso longe do chão que me viu nascer, longe do lugar de minha infância, longe do aconchego da pátria amada. Porem, cada vez que assim penso, chego sempre à mesma conclusão que, mesmo em tempos de grandes indagações e crises, o melhor lugar do mundo é onde Deus me colocou. Nem as mangas do Brasil, nem os amigos que amo tanto, nem a oportunidade de direcionar teatro para 50 pessoas, nem as praias maravilhosas do Cabo Frio, nem mesmo o pequi de Goiânia, pode trazer mais alegria ao meu coração do que a certeza de estar no lugar onde Deus me plantou.

Alguns afirmariam: se morasse no sul da França diria o mesmo. Verdade, ajuda, viver num lugar tão lindo, todavia não me esqueço daquela historia das cinzas no paraíso. Nem tudo aqui são flores e mesmo o violento e maravilhoso golfo de Gasconha, a gastronomia famosa, as lindas montanhas, nada poderia fazer com que permanecêssemos aqui, somente a graça divina o faz. Nossas mãos estão num arado que ara num mundo invisível. Nosso trabalho está mais para campo de batalha do que para pique-nique à beira mar, pois labutamos não apenas na terra que pisam nossos pés, mas numa realidade que somente é visível aos olhos do espirito. Ainda bem que nos lugares celestiais, Deus tem paciência comigo.