A
grelha de São Lourenço
O
trem subia, feito serpente de ferro, as montanhas do país Basco
espanhol. No inicio da viagem, as paradas anunciadas em espanhol,
basco e inglês, era folclórico e interessante. Seis horas depois,
os anúncios tri-lingues enchiam a paciência dos passageiros e nosso
maior desejo era que o bendito trem chegasse em Madri. Eu estava indo
ao congresso Fortalecer. Outros tantos brasileiros vindos de vários
países da região, também compareceram. Naquele dia ensolarado de
novembro, assim que o culto acabou em Biarritz, corri à
estacão e peguei um trem que chegava de Paris, atravessei a
fronteira e peguei o famoso trem poliglota em Irun.
Primeira
vez em Madri. Amei o céu azul e a limpeza das ruas da capital
espanhola. De Madri se vê as montanhas onde a conferencia aconteceu.
Um outro trem e a gente chega aos pés dos montes, sobe uma rua por
onde passaram homens e mulheres dos mais poderosos que a Europa
conheceu e chega na Casa San Jose.
Fortalecer
é aquele tipo de encontro, ao qual todo missionário, longe de casa,
sonha participar. A gente, que vive do outro lado do mundo em países
onde uma igreja de 100 pessoas já é quase um mega church e em 10
anos de pastorado se batiza sete pessoas. Aquele tipo de encontro
que, ou te deixa com complexos de inferioridade e deprimido, ou trás
alento novo ao seu coração. Você diz consigo mesmo: 'Se Deus
pode utilizar os mineiros, paulistas, cariocas, o pastor tal, a
igreja tal, nesta e naquela circunstancia, ele por certo fará algo
tremendo aqui na França, Itália, Portugal, Espanha... Contextos,
culturas e línguas diferentes, mas o mesmo Deus'.
O
louvor devorando nossos corações, consumindo o silencio de anos
cantando com apenas quarenta pessoas. Estar com tanta gente do país
amado e que, como a gente, saiu de casa para anunciar as Boas Novas
em terras europeias, consola tanto! Ficávamos sem saber se riamos ou
chorávamos. A maioria das vezes, ambos.
A
animação é grande. Os preletores vem daquelas igrejas que são tão
grandes que aos olhos franceses, espanhóis, portugueses, italianos,
parece grande demais para ser verdade. Um dos responsáveis dá as
boas vindas aos missionários e pastores vindos de vários países da
Europa; vindos dos USA e de outros lugares que por motivos de
segurança, não serão citados nesta cronica.
As
apresentações continuam. O momento tão esperado chega finalmente.
Os preletores se levantam e vão à
frente. A gente fica meio decepcionado, tal o profeta Samuel diante
da simplicidade do pastor de ovelhas que ele ungiria rei de Israel.
Eu imaginava o pastor tal bem maior, menos gordo e mais bonito também.
Pastores
super ocupados, dois quais, alguns eu nem imaginava que um dia
apertariam minha mão. Um deles até me perguntou se não me havia
visto em algum lugar. Eu fiquei contente, era de se esperar, mas por
certo que um homem que prega todos os domingos para milhares de
pessoas, não saberia quem era o franco-brasileiro, menos conhecido
do circuito evangélico, que segundo certas estatísticas, passam dos
40 milhões.
Para
meus irmãos franceses é quase que querer comparar nosso planeta com
a galaxia onde moramos. São números que não se pode entender aqui.
E
lá estavam os pastores
famosos e cheios de compromissos, que atravessaram o oceano para
falar para um gato pingado de missionários e pastores. Quem se
importa em falar para gente como nós, que não damos ibope algum!
Alguém já ouviu falar da igreja evangélica francesa, espanhola,
italiana, portuguesa, etc... que tem 30, 40, 50, 10, membros que não
publica revista alguma, que não grava cd algum de louvor, que quando
batiza uma única alma, já faz festa? Mas por incrível que pareça,
os homens famosos vieram, falaram, encorajaram e fizeram a gente
chorar.
Números
não impressionam a Deus, creio. Alias nada deve impressionar o
Senhor do Universo. Se um dia for possível que ele se surpreenda,
imagino que vai ser com a simplicidade do seu povo, com o coração
simples que se importa, que chora e que abraça o missionário sem
nome. Deus se alegra com a alma singela, acostumada a orar por
milhares de uma só vez e que ao orar por você diz: 'Senhor
abençoe o Damaceno...eu profetizo que a obra do Senhor na França
não morrerá, mas prosperara....'
Saindo
da Casa San Jose, virando à direita, subindo a ladeira, a gente
chegava aos pés de um dos maiores monumentos do país, O El
Escorial. Um
monumento complexo, construído pelo rei Filipe II da Espanha no
final do seculo XVI, em comemoração da vitoria na Batalha de Saint
Quentin em 10 de agosto de 1557 sobre as tropas de Henrique II, rei
da França; e para servir de lugar de enterro dos restos mortais de
seus pais, o Imperador Carlos I e Isabel de Portugal, assim que seus
próprios e dos seus sucessores. O El Escorial é também um
santuário erigido à gloria da contra-reforma. Ali dentro estão
guardadas uma das maiores coleções de relíquias do mundo católico.
Cerca de 7 500 relíquias são guardadas no famoso monumento.
A
planta do edifício, com as suas torres, recorda a forma de uma
grelha, pelo que tradicionalmente se diz que se fez assim em honra à
São Lourenço martirizado em Roma no suplicio da grelha.
As
cinzas de Charles Quint, pai do construtor do El Escorial e famoso
rei espanhol, nascido em Gand, na Bélgica e que reinou sobre os
Países Baixos (norte da França, Bélgica e Holanda), foram
transferidas e colocadas na catedral dentro do famoso monumento, ao
lado de seu filho Filipe II. O mesmo Charles que combateu os
protestantes no inicio da Reforma e foi Imperador do Santo Império
Romano Germânico. Considerado o príncipe mais poderoso do seculo
XVI. Um homem que viveu apenas 58 anos, mas teve grande influencia na
historia da Europa e das Américas.
Olhando
o impressionante monumento funerário a gente fica pensando como um
homem tão poderoso se resume hoje, a um amontoado de poeira! De belo
somente o mármore que cobre a poeira fúnebre que ninguém ousaria
expor. Um homem temido por tantos, grande conquistador, defensor da
santa fé romana, reduzido à poeira histórica.
Voltando
da conferencia, fiquei pensando que no final das contas, poderoso
mesmo, só aquele que vive e reina pelos seculos dos seculos diante
de quem todos nós, crentes, pastores, missionários, mercenários,
reis, presidentes, poderosos, gentalha em geral, um dia
compareceremos.
Um
por todos e todos por um.
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